11 de julho de 2009

Babel...Breve Análise Fenomenológica

Quem pode contra a facticidade da vida? Como lidar com a finitude iminente?
O filme Babel nos faz pensar a respeito disso.
Numa trama que une pessoas de diferentes idades, culturas e possibilidades, pode-se encontrar conceitos discutidos pela Filosofia desde seu início na história da humanidade.
Perguntas que nos remetem ao sentido das nossas vidas, a impossibilidade de controle ou escolha diante de muitas situações, o encontro de novas possibilidades frente a diferentes acontecimentos, o fim inevitável a todos os seres humanos e a certeza de que...
“ A dor é universal e a esperança também!”
O filme Babel é de um teor emocional e realista fortíssimo e a escolha de uma ou duas cenas pra uma análise mais profunda é uma decisão difícil, mas escolhi uma e a lancei sobre ela um olhar Fenomenológico.

ENTRE A VIDA E A MORTE

As coisas perderam o sentido, a vida está se perdendo. Há poucos momentos a esposa de Richard sentia-se estressa e infeliz por estar num lugar que não havia escolhido estar. Mas estava! E já que estava ali, tentava buscar um sentido, mas seu esposo preferia o silêncio ou a fuga, como de costume. Há poucos momentos ela escolheu não beber coca com um gelo feito de uma água que não poderia comprovar-se pura, agora, ali está Susan, no chão de uma casa, aos cuidados de uma mulher com mãos sujas, sendo costurada em seu ferimento por uma agulha de um veterinário e mais tarde, fazendo xixi nas calças.

A morte iminente muda os significados, a fragilidade do ser humano é assim, em questão de segundos tudo pode mudar. Mas o esposo dela está ao seu lado e ela deseja sua presença. Richard também muda diante da finitude que ameaça levar com ela o seu amor. Novas possibilidades! Antes, Richard não podia encarar a dor da morte do filho, ele fugiu, agora, não faz mais sentido, ele pode, talvez tenha pouco tempo, talvez nunca mais possa! Ele precisa aproveitar, porque senão, como será encarar a culpa do não ter dito o que precisava ser dito? A culpa de não ter pedido perdão, de não ter repetido o ‘eu te amo’ que provavelmente havia perdido o seu lugar na relação há tempos?
Resta pouco tempo agora, a ambulância não chega, nem o helicóptero parece estar vindo. Os turistas partem com o ônibus. Egoístas? Ou simplesmente escolhendo cuidar de si mesmo? Quem pode julgar os significados e valores deles? Afinal, todos somos ser-para-morte não é mesmo? Será que não é instintivo tentar fugir deste destino? Como eles lidarão com a culpa caso Susan morra é outra história.

O que importa agora é o ser-com que envolve sim Richard e Susan, especialmente, mas também envolve o guia da excursão, solidariedade sem interesse, de alguém que mais tarde não aceitará o pagamento, em dólares, veja só! E a solicitude da senhora que abriu sua casa para receber Susan e que também cuidou dela? “Chamem um médico!”; “Por favor! Alguém me arrume um médico ou será tarde demais!” Pensamentos naturais, perfeitamente ajustados à condição humana, Richard chora!

Um médico, não! Um veterinário e mais uma demonstração de solidariedade que chega junto com a que poderia ser recebida com status de verdade absoluta se dada por cirurgião de Manhatan, mas que ecoaria com a mesma força no coração de Richard e Susan...”Se não fecharmos a ferida, ela irá sangrar até morrer!”

Morrer! Mas porque é tão difícil lidar com algo tão comum a toda espécie humana. Este casal mesmo já havia lidado com tantas pequenas mortes em tantas outras situações, será que se lembram do momento exato em que a comunicação perdeu o significado na vida a dois? Ou onde ficou valor que havia no hábito de andar de mãos dadas ou de dormir abraçados e/ou rirem juntos? Mas agora é diferente, é a perda pra sempre que desenha a facticidade deste casal. Um novo projeto precisa ser elaborado e Susan diz...” Se eu morrer, não abandone as crianças”! E Richard, ainda que desesperado com esta possibilidade responde: “Eu nunca os deixarei de novo”, a partir de agora o sentido da vida dele seria outro? Sim, seu destino corria o risco de mudar, mas na verdade já estava diferente, desde o momento em que ele se deparou com a sua mulher sangrando, logo após ter recebido o tiro.

Richard agirá de forma diferente agora, não os abandonará como fez com quando seu outro filho morreu. E quanto a Susan? Tão próxima daquilo que é o futuro de todos nós, a finitude, a morte...quais são as intenções que a levam a expressar através da linguagem...ainda que com pouca força pra falar a possibilidade de ser culpada, de ter sido considerada culpada, pelo marido, por ela mesma. Devedora! Faltante, ela diz – “Não foi minha culpa, ele não estava respirando” – não um falatório apenas, uma fala significativa, emocionada, talvez uma parte dela que esteve escondida, quem sabe irreconhecível na maior parte do tempo, revelando sentimentos que nem pra si mesma imaginou conseguir assumir, reconhecer como seus...autenticá-los!

A conversa deste casal, diante da finitude, foi terapêutica, pois foi significativa e permitiu uma nova forma de ser-com entre eles que irá gerar novas maneiras de ser-no-mundo. O objetivo era experimentar a presença um do outro, compreender era o verbo perfeito pra este encontro, junto com o mais importante de todos, amar. Conceitos e verdades absolutas foram deixados para trás e novos sentidos estavam se articulando, significados antes cristalizados caíam ao chão, pra ele, para ela, para toda a família.

Nenhum comentário: