A Ética Filosófica Moderna está atrelada à noção de dever absoluto e tem como intuito libertar o homem do poder de seus impulsos irracionais, para isso, disseminou um método sistemático de conduta racional.
Este sistema de regras se apresenta recortado pela obrigação moral que estabelece disciplinas repressivas possibilitadas por meio da “primazia do controle no cotidiano moderno” (FOUCALT, 1996). Atrelado a isso, estão promessas de felicidade e realização possíveis, desde que sob a obediência ao sistema.
Esta combinação de fatores acabou por promover mecanismos de inclusão e exclusão, na medida em que as demandas sociais dos grandes centros tornavam-se incontroláveis. Eis a ambivalência da ética moderna: a impossibilidade prática de responder aos seus ideais, gerando contradições significativas.
O mal estar causado por essa realidade culminou na crise que impulsionou as sociedades ocidentais à nova perspectiva cultural e ética classificada pela Era do pós dever, discussão encontrada no filme Laranja Mecânica, que vislumbrou da falência da Ética Moderna e suas regras, tidas como eficazes na extinção de valores anormais à sua perspectiva.
Inaugurando modos inéditos de comportamento, Alex e seus amigos buscam o oposto das regras modernas de moral e repressão e têm como ideal de prazer a quebra de paradigmas sociais, eles são os “estranhos” que não se encaixaram no modo de vida imposto pelo sistema capitalista, denunciando que não há uma ordem total.
Um cenário bastante confuso, no qual convivem diferentes fenômenos que mesclam a moral moderna e era do pós dever, identificados nas máscaras usadas para cometer atos de vandalismo, dando uma idéia de dualidade; bem como o fato dos garotos beberem leite antes de sairem para praticar atos de vandalismo, o que denota a idéia da pureza perseguida pela modernidade ao mesmo que faz alusão ao nazismo (também representado nas roupas e nas atitudes de Alex e seus "druguis" - palavra originária do russo druk, amigo), e, por fim, a devoção à 9 sinfonia de Beethoven, usada como uma ode à moral e à cultural da época de sua criação. Lemos:
“Lipovetsky (2005) caracteriza essa convivência de dois discursos contemporâneos afirmando que de um lado, há um novo impulso moral; de outro, há o abismo da decadência, atestado pelo aumento da violência, da delinqüência e dos movimentos fundamentalistas, além do aumento das drogas e as novas formas de miséria” (MAIORINO, 2007, p. 1).
O filme também faz alusão ao Panopticum – modelo prisionário analisado por Foucault:
“O tratamento Ludovico visa a sujeição direta e automática, involuntária do indivíduo desviante através de seu condicionamento corporal, inscreve-se assim no moderno regime escópico do panopticum precisamente como um mecanismo automatizante de controle destinado á prevenção de falhas do funcionamento social disciplinar. A história do tratamento Ludovico é uma história falhada” (FREITAS, 2008. p.28)
Frente a estes aspectos, o filme apresenta a dicotomia entre a valorização do indivíduo, decorrente do contexto histórico da pós modernidade (neo individualismo) e as concepções ainda não abandonadas a respeito da adequação ao que é socialmente aceito – representando os ideais modernos.
Leia mais em: FREITAS, M.R.B. “O Panoptismo no Cinema: a Construção do Espaço Através do Olhar”. Disponível em: http://www2.dbd.puc-rio.br/pergamum/tesesabertas/0610539_08_pretextual.pdf