18 de abril de 2010

Ilha do Medo

Fui assistir Ilha do Medo no último feriado, um filme muito interessante que, como dizem alguns críticos, “flerta com o estilo de Alfred Hitchcock no gênero de film noir”, creio que a cena que mais dá essa impressão é a do enquadramento DiCaprio no chuveiro, como em Psicose (1960), além da trilha sonora no estilo de filmes antigos de suspense que funciona bem pra gerar muita tensão. O texto é de Dennis Lehane, o mesmo autor de Sobre Meninos e Lobos e tem Leonardo DiCaprio produzindo e atuando brilhantemente no papel principal.

A trama se passa nos anos 50. Teddy Daniels (DiCaprio) é um detetive da polícia federal enviado para Shutter Island, ilha na qual funciona um presídio de segurança máxima para psicopatas. Teddy, acompanhado de seu parceiro Chuck (Mark Ruffalo), tenta desvendar o desaparecimento misterioso de uma mulher acusada de matar os próprios filhos.

Este mistério se amplia durante a investigação e o detetive começa a sentir que não pode confiar em ninguém. O filme mostra Teddy envolvido em labirintos psicológicos, que para o expectador se apresentam num conflito entre o real e o fictício e, desta forma, instala-se o ambiente de insanidade do longa. Um aspecto interessante é que Scorsese mescla a alucinação e realidade utilizando-se de uma estratégia, o onírico, assim, os sonhos de Teddy fazem com que algo que parecesse um erro ou um descuido na produção cinematográfica, se mostre como parte do psiquismo dele.

Martin Scorsese, que tem sido apontado como um dos maiores diretores, vivo, do cinema norte-americano, desta vez faz um sombrio filme de suspense que gira em torno de uma história marcada por uma experiência emocional intensa e a impotência de um ser humano diante dela. Em minha opinião, o filme nos faz refletir sobre nossas próprias fragilidades, é um mergulho profundo no universo da alma humana, onde estão abrigas a sanidade e a loucura.

O estudo da Psicopatologia mostra que um acontecimento traumático é um causador em potencial da cisão entre o ego e a realidade, na medida em esta ruptura se dá por meio da recusa do indivíduo em reconhecer a realidade de uma percepção traumatizante. Segundo Freud, a Psicose é o resultado do conflito entre o Ego e o mundo externo e ocorre em dois momentos: no primeiro ocorre a recusa da realidade e no segundo a construção delirante, que consiste num “remendo aplicado no lugar em que originalmente uma fenda apareceu na relação do Ego com o mundo”.

A cisão com a realidade é a maneira como o psiquismo humano lida com a dor profunda e a dificuldade de sua elaboração, ela ocorre quando o ego não dá conta de aplacar a energia de uma experiência de dor intensa já que a excitação provocada por ela é desproporcional à capacidade do ego em domesticar sua lembrança. Dois mundos se formulam desconectadamente na mesma mente e a alucinação vem numa tentativa de eliminar o desprazer causado pela insatisfação de necessidades.

“A Psicose se depara com a tarefa de
conseguir para si própria percepções de
um tipo que corresponda à nova realidade e isso muito
 radicalmente se efetua mediante a alucinação” (FREUD, 1924)

O filme Ilha do Medo nos mostra bem esta teoria e nos faz entender melhor o sofrimento do doente mental, bem como imaginar a dor de seus familiares diante da psicopatologia.

Leia mais sobre o assunto:
Livro: Esquizofrenia – Coleção Clínica Psicanalítica (Casa do Psicólogo)